quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Um dia na vida de um pajem

Pajem: rapaz que, na Idade Média, acompanhava um príncipe, um senhor, uma dama, para prestar-lhes certos serviços e iniciar-se na carreira das armas [Google].

Como para a maioria dos assuntos não estamos mais na idade média, hoje eu definiria assim:

Pajem: guri fofinho que mal aprendeu a andar e, lançado num corredor de igreja infinito, tem a missão de levar em segurança um par de jóias até o outro lado. Geralmente desiste, chora, derruba tudo ou corre para os braços da mãe antes de percorrer um terço do caminho o que não impede que as noivas continuem apostando no sucesso da operação. Afinal, ele é muito fofinho.

Minha irmã casou no último fim de semana e com muita sabedoria nos deu a honra de acompanhar o Pedro, pajem iniciante, na missão-aliança. Adianto que todos chegaram ao altar com sucesso, mas antes disso quero contar um monte de coisa.

Roupas

PUTA QUE PARIU! Alguém aí sabe quanto custa vestir uma criança de 2 anos socialmente? Eu não sabia. Sou um mão de vaca firme para os gastos infantis e imaginava que o abusivo mercado de coisas pra criança não perdoaria alguém pequeno querendo se vestir como um lorde. Tenho dificuldades pra gastar em roupas pra mim (que serão usadas por cerca de 7 anos) o que custa uma roupinha dessas (que não servirá mais em 7 semanas). 

Como o casamento era de dia, optamos por um visual um pouco mais descontraído que pode ser comprado na Renner por apenas 50% do absurdo.

Avião

Pela última vez, Pedro viajou de graça. O limite de 2 anos batia com a volta do casamento. Viajar de graça significa viajar no colo e mesmo num voo de 40 minutos é bem dificil explicar a um jovem pajem que ele tem que ficar sentado-com-o-cinto-afivelado-encosto-reto-e-bandeja-travada. Quer andar da cabine ao banheiro N vezes.

Dica para as noivas: decore sua igreja para parecer um avião e seu pajem vai percorrer o corredor feliz e sem imprevistos.

Hotel

Entendo a necessidade de otimização de espaço mas você empreendedor de sucesso da rede hoteleira: pense num box que caiba uma pessoa e meia. Eventualmente pode ser necessário dar banho numa criança.

Dica aos viajantes: quando forem ao Rio e quiserem passar um tempo na Barra da Tijuca, recomendo o Ibis da Av. do Pepê. Apesar do box-supercompacto os apartamentos de final 5 tem vista pro mar, o preço é decente e tem uma cama dobrável bem boa pra acomodar os pequenos (de novo: não ganho nada. Indico quando gosto).

Parentes

A família foi em peso pro casamento. Fizeram um esforço e marcaram uma presença bonita e divertida. Deixaram as crias com as vós e se esbaldaram no turismo pela cidade. Não participamos dessa parte. Um ensinamento importante da paternidade é que passeio com filho atrapalha quem está passeando sem filho. 

Recado importante as mães-verdade: Não é crime deixar filho com alguém pra se divertir um pouco. Ter consciência que criança de colo anula qualquer diversão adulta não tem nada a ver com o amor que vc sente e o cuidado que vc tem. Portanto quando vir alguém deixando um bebê com a vó pra ir encher a cara, não encha o saco. Cada pai/mãe sabe o que faz.

Na hora H, no dia D

Chegou o grande dia e tudo estava perfeitamente sincronizado. O sono e o almoço do Pedro bateram como um relógio nos horários que a gente precisava pra se arrumar. Apesar de tanta novidade, a rotininha dele estava em ordem a acordaria no horário de sempre, perfeito pra darmos banho e colocar a beca de pajem.

Aí vem o diabo e diz "não tão rápido..."

Acordou do nada 10 minutos depois de dormir. 
Só foi ceder ao sono 1 hora depois bagunçando todo o esquema perfeito que todo pai trouxa acha que vai rolar.
Enquanto ele dormia, aproveitamos para nos arrumar. Esperamos o limite. 30 minutos antes da hora de sair e o guri ferrado no sono, sem banho. 

Vamos acordar.

Como esperado, acordou irritado, mau humorado, agitado, um saci. Interromper o sono é critico mas não tinha jeito. Pra piorar a coisa la foi o pai todo bonito e cheiroso enfiar o moleque no chuveiro. Poesia pura. E como se o caos já não tivesse batido o recorde histórico, era preciso colocar nele uma roupa que continha suspensórios e gravata borboleta.

Foi fácil como... colocar um gato num saco.

Era impossível. O máximo que conseguimos sem causar um atraso foi enfiar a roupa de qualquer jeito e levá-lo pro embarque (o casamento era numa ilha) todo desgrenhado, sem sapatos e... dormindo. Sim, porque depois de toda essa luta ele precisava continuar o sono que interrompemos.

Como era um casamento, o cramulhão saiu de cena e as coisas começaram a chegar no lugar novamente. Terminamos de arrumar o moleque no pier, ele curtiu andar de barco e chegamos no casório.



Cheguei lá meio perdido com todo o agito, a emoção de ver casar uma irmã, o lugar arrumado com infinitos detalhes impecáveis que eu queria prestar atenção e a cerimonial no nosso pé tentando garantir que as alianças iam chegar pontual e impecavelmente nos dedos dos donos. Minha Elaine me deu um soco na cara pra me trazer de volta a realidade e lembrar que tínhamos que dar comida pro Pedro imediatamente ou isso se tornaria um problema. Que tal uma frutinha sem poder sujar nada? Mais poesia. Conseguimos.

Tudo beleza, tudo fantástico, céu de brigadeiro pro casamento ao ar livre. A boa música só era interrompida pela cerimonial pedindo que a gente garantisse logo um lugar na frente, imóvel e seguro. Coitada... tava grávida. Ainda vai saber o tamanho do absurdo que estava nos pedindo.

Como não podia deixar de ser, deu merda. Literalmente. Hora de trocar fralda concorrendo com hora de começar a cerimônia. O lugar tinha uma bela tenda de brinquedos pra criança, mas nem sequer um trocador. Deitar o sujinho em cima da mesa era mancada, juntamos duas cadeiras num canto meio escondido e la vamos nós na missão sem-sujar-nada mais uma vez.

Recado para quem tem locais de festa para alugar: um trocador portátil custa menos de R$ 200. Por menos que vc goste disso, crianças estão por toda parte e fazem um bocado de cocô mesmo quando estão no seu recanto dourado impecável.

Com um par de pezinhos numa mão e uma fralda na outra fui interrompido pela cerimonial lembrando que se não fossemos AGORA alguém ia pegar nosso lugar. Expliquei pra ela que não era correto que o pajem comparecesse nu e com a bunda suja. Ela compreendeu.

A cerimônia começou e a missão agora era distrair nosso menino enquanto muita coisa bonita acontecia la na frente e eu não conseguia acompanhar. Uma peça de lego passeando entre os pratos e copos resolveu o problema. vrum vrum vrum.

Decoradora desesperada lembrando que tem um canto só pra crianças.

- Depois a gente arruma, moça. Não da pra sair daqui. - Ela não compreendeu.

Pajem

Finalmente, o momento do pajem. Minha irmã caprichou na referência e escolheu uma música que tb tocou no meu casamento. Emocionante. Caminhamos todos sem problemas e as alianças seguiram seguras para os dedos do casal. Missão cumprida, Pedro feliz no colo da minha tia indo pro canto dos brinquedos.

Soneca

A festa já tava animada, já era noite e chegou a hora de dormir. Garimpei qualquer coisa onde pudesse deitar o Pedro e achei umas almofadas retas, tipo colchonetes. Acomodei no chão perto da nossa mesa e ali ele ficaria. Ficaria se não tivesse aparecido uma criatura organizadora:

- Você não pode usar essas almofadas
- É só pra deitar o bebê
- Não pode colocar isso no chão
- OK, desculpe. Mas me dá uma idéia melhor, ele dormiu.
- Tem a tenda dos brinquedos que a gente preparou pras crianças
- Sim, mas lá não da pra dormir. Além disso é perto do barranco. Se ele rolar, cai na água
- Você tem que ficar la com ele
- Vc quer que eu me isole no casamento da minha irmã pra evitar usar suas almofadas, é isso mesmo?
- O espaço das crianças é lá
- Deixa eu adivinhar: vc não tem contato com nenhuma criança na sua vida. Nenhum sobrinho, ninguem. Certo?
- O espaço...

Virei as costas e saí. Afinal era dia de festa. No fim o primo arrumou um banco macio e a gambiarra dele ficou melhor que a minha.

Dica para organizadoras de festa: crianças fazem parte do mundo, pedimos desculpas pelo inconveniente.

Finalmentes

Fiquei muito feliz de ver minha irmã casar. Ela fez uma festa com um bom gosto que nunca tinha visto, escreveu um texto inspirador para celebrar a própria união e escolheu pra si um parceiro de verdade. Um cara "gente nossa" demais. Formam um casal de gente certa daquelas que não se atreve a jogar plástico no lixo de papel, que não reconhece um famoso no aeroporto mas pode discursar por horas sobre todas as implicações politicas e ambientais da maldita obra aeroportuária no lugar errado.

Irmã, o que conto aqui no blog é sempre a parte que tem a ver com o Pedro e a diversão é sempre por conta das presepadas, mas seu dia foi perfeito como vc sempre mereceu. Aqui de fora vejo o maridão como a peça exata pra completar o quebra-cabeças de milhão de peças que vc vem montando desde criança. 

Você conseguiu juntar em torno de si uma família de fazer inveja. Família ampla feita de parentes e não-parentes. Alguns que eu nunca tinha visto mas estou certo que sabem de você mais que eu. Em eventos como o seu que a gente vê o privilégio que tem sendo parente dos amigos e também amigo dos parentes. Se for com o mesmo cara recomendo que case de novo. Foi muito legal!

Dica pros noivos: Nada. Só continuem como estão. :-)





2 comentários:

  1. Nem consigo comentar..... Texto lindo, perfeito,emocionante e lindo como sempre.

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  2. Cara, muito bom! Morri de rir, seus posts são ótimos! Por mais pais como você no mundo ��

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