segunda-feira, 10 de março de 2014

Pra não dizer que não falei dos chocolates

Ontem nós três saímos pra comer uma pizza. Pedi mesa pra dois-e-meio e no fim descobri que precisa mesmo uma mesa pra quatro. O carrinho ocupa lugar demais. Pizzaria movimentada por causa do dia da mulher. Chegaram as bebidas finalmente:

- Um brinde
- Viva!
- Deixa eu ver o que vamos brindar...
- Hum...
- Sei lá... a nós!
- Poxa meu lindo! E o dia da mulher?
- Ah, droga... foi mal. Esqueci.
- Viva!
- Viva!

Ficamos falando sobre o tal dia da mulher entre goles e balanços no carrinho. Mais que dia de dar flor e chocolate, dia de refletir.
Longe desse papo bobo "ó que seria de nós sem elas", "ó, mães e esposas dedicadas que cuidam da gente" mas uma reflexão de verdade, que nos afaste da fala superficial da TV e do comércio.

Para nós homens, reflexão sobre o que temos sido para nossas mulheres. Nos comportamos como parceiros leais que também fazem renúncias para abrir espaços ou apenas como donos generosos como era há 200 anos? Entendemos direito o que foi conquistado por elas ao longo dos séculos que as reprimimos? Estamos prontos para debater ombro a ombro ou ainda disfarçamos nossa a velha forma de agir "permitindo" que façam o que quiserem? Conseguimos assimilar com naturalidade que a função de colocar dinheiro em casa e não se preocupar com mais nada é retrógrada e nos faz pequenos?

Para elas, dia de se perguntar se a idéia de igualdade cai bem ou se é mais confortável o revanchismo de ridicularizar machos como um bando de Homer Simpsons desorientados. Refletir se a raça humana realmente aprendeu algo com tanto preconceito de gênero ou se o desejo é que a opressão apenas se reverta contra o opressor. Analisar se estão prontas para recusar lutas bobas que massageiam o ego mas no fundo só fazem o mundo mais sexista medindo se quem pode mais são homenzinhos ou mulherzinhas. 

Outro dia vi uma entrevista do Morgan Freeman onde o coitado do repórter perguntou pra ele como era ser um negro tão cabuloso no cinema, que atingiu tudo que atingiu. Ele ficou puto e deu uma resposta que serve para todas as conversas fiadas acerca de grupos que sofrem/sofreram algum tipo de discriminação. Foi mais ou menos assim:

- Enquanto existir essa pergunta, nada mudou. Se ainda te chama atenção o fato de eu ser negro então está tudo errado. No dia que sua entrevista for do começo ao fim e vc nem lembrar que eu sou preto, então o mundo evoluiu.

Por isso mulheres, jamais se deixem seduzir pelo discursinho de "veja essas mulheres bem sucedidas" pois eles são como dizer "ficou lindo" pra um rabisco de uma criança de 4 anos. Pensem se devem mesmo apoiar candidatas que vão a tv dizer que "vão levar a força da mulher para o congresso" ou se devem cobrar que mostrem um bom projeto sem usar a roupa de baixo como argumento.

Muitos criticam a existência do dia. Sustentam que se já há igualdade, pra que um dia pra elas? O dia existe porque há muitos anos mais de 100 mulheres foram queimadas vivas dentro de uma fábrica por reivindicarem seus direitos. Essa afronta não pode ser esquecida jamais. É por isso que o dia é de pensar e não de comer chocolate. O dia da mulher é como uma linha que existe pra marcar o lugar aonde ficava o muro de Berlim: Quando não tiver mais nada pra brigar, a lembrança tem que estar lá pra que jamais se repita.

E chegou a pizza.

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